Corte em crédito rural no Orçamento de 2021 ameaça agricultura familiar

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Produtores rurais se mobilizam para tentar reverter cortes feitos no Orçamento de 2021 que reduzem em 35% os repasses para o setor mais sensível do campo, a agricultura familiar.

No fim de março, o Congresso aprovou o projeto orçamentário para o próximo ano com corte de R$ 2,5 bilhões na subvenção econômica ao crédito rural. O Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) perdeu R$ 1,35 bilhão. Pela proposta original do governo, o programa receberia R$ 3,8 bilhões neste ano.

A verba é usada não apenas para bancar o plantio diretamente, mas para sustentar empréstimos nas linhas do Pronaf que chegam a superar R$ 30 bilhões.

A agricultura familiar é praticada em 77% das propriedades produtivas do país, que corresponde a 23% da área agrícola, e garante renda e alimento para 10 milhões de brasileiros, de acordo com o mais recente Censo Agropecuário do IBGE, relativo a 2017. O valor de produção desse tipo de plantio, porém, é inferior ao alcançado nas grandes propriedades, representando 23% do total.

“O corte no Pronaf surpreendeu muito o setor porque, em São Paulo, por exemplo, 78% dos agricultores são pequenos e cerca de 90% usam o programa”, afirma Tirso Meirelles, vice-presidente da Faesp (Federação da Agricultura do Estado de São Paulo). Nessa categoria estão, por exemplo, os produtores do cinturão verde, que abastecem a região metropolitana com hortaliças.

Para a Faesp, o enxugamento do programa preocupa muito porque compromete não apenas o próximo Plano Safra, mas também afeta a renda dos produtores na etapa final da safra de 2020/2021, que se encerra em 30 de junho deste ano.

A redução nos repasses pode levar até mesmo a interrupção imediata de linhas de financiamento rural, de acordo com a federação.

O setor trabalha para que o valor seja recomposto em um projeto de lei a ser apresentado pela Câmara dos Deputados. A meta é igualar o volume da subvenção de 2021 ao de anos anteriores

Por causas desse e outros cortes, bem como da adição de emendas de parlamentares, questionados por economistas e integrantes da equipe econômica, o Orçamento deste ano ainda está parado no Congresso. O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tem até 22 de abril para sancionar a proposta.

Representantes da agropecuária, que fazem parte da base aliada ao governo Bolsonaro, buscam uma articulação com parlamentares e membros do Ministério da Agricultura para tentar reverter a situação. Lideranças de federações agrícolas e da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura) pediram à ministra da Agricultura, Tereza Cristina, na terça-feira (13), que intervenha em favor dos pequenos produtores.

Segundo Aristides Veras dos Santos, presidente da confederação, a ministra teria tranquilizado produtores ao afirmar que não faltarão recursos para a agricultura familiar. “Mesmo assim, vamos manter a coalizão”, afirma Santos.

Dedicada ao mercado interno, a agricultura familiar é mais sensível a mudanças de subvenção do que a agricultura tradicional e exportadora de matérias-primas, que tem recursos com venda futura e mais capital de giro. O valor médio dos custeios do Pronaf, segundo especialistas, é de R$ 40 mil por ano, o que custa ao governo cerca de 10% e mantém uma média de três pessoas ocupadas por ano.

João Luiz Guadagnin, especialista em crédito rural e diretor no Ministério de Desenvolvimento Agrário no governo durante a gestão de Luiz Inácio Lula da Silva, diz que os repasses para Pronaf já são insuficientes e o Congresso tem alternativas para remanejar os recursos, manter a verba original prevista para o pequeno produtor e evitar o que chama de “o caos” no financiamento agrícola.

“Tem que tirar dinheiro das emendas parlamentares ou dos militares, que tiveram reajuste no orçamento”, afirma. “Se não houver remanejamento, a Secretaria do Tesouro terá que pedir, no máximo em maio, para que parem as contratações com o recurso subvencionado.”

O remanejamento de recursos na peça orçamentária também afetou o Ministério da Agricultura. Inicialmente, a dotação orçamentária prevista era de R$ 11,9 bilhões. Após a redução no Congresso, a pasta ficou com R$ 9,15 bilhões, redução de 23%.

Também foram afetadas operações de crédito, subvenção de seguro rural, operações de investimento, custeio e alongamento de dívidas e programas de apoio à comercialização também serão afetadas.

Em nota, o Ministério da Agricultura afirma que os impactos das alterações no orçamento ainda estão em avaliação pela área técnica da pasta.